quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Terrinha a vista.

Desde que cheguei em Israel, passei, naturalmente, a ter um olhar mais crítico com relação à Comunidade Judaica Brasileira na qual, até com algum fervor, durante um tempo, tive participação ativa. O primeiro postulado que me parece bastante claro, por mais polêmico que possa parecer e por mais críticas que possa receber, é "Sionismo sem Aliá perde o sentido".

A história que o Sionismo tem várias gradações pode parecer, na teoria, muito interessante e romântica mas, na prática, o mero apoio à existência de Israel, moral e/ou financeiro, como toda a sua relevância, afasta-se, na essência, do conceito de Sionismo real.

Essas elucubrações ganham mais importância em momentos, como o presente, quando o antissemitismo moderno transmuda-se, às claras, em anti-israelismo. Não são raros - mais, são crescentes - os discursos mundiais que põem em xeque a legitimidade da existência do Estado Judeu.

Tenho um caro conhecido que, bem à época do episódio da flotilha vinda da Turquia para furar o bloqueio marítimo a Gaza, que foi abordada violentamente pelas Forças de Defesa de Israel, esteve no Brasil, e pôde, de forma cristalina, sentir uma latente preocupação da Comunidade Judaica Brasileira sobre sua segurança em terras tupiniquins; tudo, em razão das reações que se sentiram por lá.

E não falo da quase esquizofrênica mania de Mossad, de que é fomentadora a Comunidade Judaica Brasileira quando alicia jovens com discursos ufanistas para fazerem a sua pseudossegurança. Parabéns a todos que se engajam nesse projeto, pelo idealismo e dedicação, mas fiquem sabendo que suas contribuições são equivalentes a uns famosos versos de Geraldo Vandré em "Para Não Dizer que Não Falei de Flores".

Outra premissa importante para as conclusões que expressarei ao final é a forte - porém tapada com a peneira - ligação entre Aliá e a condição socioeconômica de seus candidatos. Posso dizer, com o mínimo risco de estar errado, que mais de noventa por cento daqueles que vêm se aventurar em Eretz não são dotados de um pujante sentimento de amor a Israel, amor esse a ponto de projetarem sua Aliá como um mero ideal. Vêm para cá em busca de uma nova oportunidade socioeconômica. Ouvi de uma pessoa muito querida, nesse sentido, que Israel, na verdade, deveria mudar o seu epíteto de "terra do leite e do mel" para "terra da última chance".

E essa chance é penosa. As condições de ascensão em Israel, bem possíveis diga-se de passagem, são permeadas pelas barreias linguísticas, culturais e educacionais. Enquanto no Brasil, um profissional que ligeiramente esteja acima da linha da mediocridade tem grandes chances de sucesso, aqui, ele será engolido por um mercado altissimamente qualificado e, muitas vezes, relegado a subposições que garantirão, com considerável esforço, o bastante para a sua subsistência básica. Basta dizer, para deixar isso bem claro, que a Lei de Gerson não foi - e jamais será - promulgada por aqui.

Todas essas considerações fazem-me lembrar que boa parte da Comunidade Judaica Brasileira, mormente os seus integrantes que não teriam condições de fazê-lo, constuma caminhar com os seus narizes apontados para cima da linha do horizonte. É óbvio que é injusto radicalizar e generalizar, mas o conceito de humildade, para dizer o menos, não tem lá a sua devida relevância para esse grande grupo de pessoas.

Retornando ao meu ímpeto matemático, sou capaz, agora, de apresentar meu segundo postulado: "Aliá sem humildade resulta em Ieridá, rapidamente". Veja-se bem que o conceito de humildade, aqui, é empregado em sentido lato, sobremaneira.

Abro parênteses. Nem uma reserva financeira é capaz de aplacar a necessidade de ser humilde como premissa básica para sobreviver em Israel. Pode parecer óbvio, mas as pessoas se esquecem que reserva financeira e humildade, em condições normais de temperatura e pressão, constumam ser grandezas inversamente proporcionais. Fecho parênteses.

Empreguemos, então, esses conceitos quase esotéricos à realidade pulsante.

Não tenho nenhuma vocação para pitonisa; não almejo nenhum posto no clã dos profetas do apocalipse. Contudo, um pouco de lógica e percepção da realidade é suficiente para projetar alguns movimentos possíveis, se não prováveis.

A primeira projeção é que a condução da política externa brasileira tem tudo para ser afetada pelo continuismo pragmático e aponta para, do ponto de vista macroscópico, para um enraizamento ainda mais profundo do sentimento nacionalista e, sob um dos pontos de vista microscópicos que interessa ao presente ensaio, para uma crescente aproximação de regimes, também nacionalistas, de fortíssima tendência autocrática, incluindo-se aí o do Irã.

A segunda projeção é de que o presente desafio da segunda metade do primeiro século de existência do Estado de Israel aponta para mínimas chances de solução pacífica do conflito externo israelense com o Irã e, em consequência, num afastamento óbvio daqueles países que mantiverem relações próximas com aquele país.

Essa inexorável rota de colisão - uma verdadeira mistura explosiva - há de ter consequências importantes para relação entre as sociedade civil e a comunidade judaica brasileiras. A imagem do judeu será imediatamente ligada ao apoiador de Israel, ostente ele essa condição ou não. A sensação de segurança cairá a níveis baixíssimos; não diria, eu, insuportáveis (porque lembrando a frase de um grande estadista contemporâneo, já falecido, "esse país [o Brasil] não pode ser sério"), contudo baixos o bastante a ponto de acender uma centelha de medo naqueles mais esclarecidos.

Projeto que uma boa parte da Comunidade Judaica Brasileira - diria eu, a arraia miúda acompanhada da casta imediatamente superior - considerará fortemente a Aliá como uma opção segura. E desse grande número de pessoas, não tenho medo de arriscar que uns dez a quinze por cento encontrarão outros motivos, fatalmente ligados às suas condições socioeconômicas, para concretizarem a sua vinda a Israel.

Essa onde que, salvo engano, já teve algo similar - guardadas as devidas proporções e as conjeturas históricas - na década de 1960, será capaz de dobrar a população brasileira em Israel, desconsiderado eventual crescimento vegetativo dos já aqui encontrados, num prazo, digamos, sem muita precisão, de 5 a 10 anos.

É óbvio que esse movimento tem algo de muito positivo e uma imigração desse porte é muito bem vinda por aqui, por vários motivos que fogem ao escopo do que ora escrevo. Talvez numa próxima oportunidade.

Mas temo - e aí vai a minha arriscada, porém convicta, conclusão - que boa parte desse contingente terá um destes dois destinos: ou não suportarão ser confrontados com suas respectivas empáfias - e com a fatídica dispensabilidade de suas arrogâncias para o engrandecimento de Israel - e engrossarão as fileiras daqueles que cogitarão a falta de necessidade de um Estado Judeu; ou por aqui permanecerão subsistindo não sem inculcar em outros as mazelas de suas incapacidades pessoais.

Contudo e com tudo, Israel há de sobreviver. A seleção natural cuidará para que a parca minoria vencedora vingue e continue a contribuir para a legitimidade de um país qu se orgulha de sua capacidade intelectual e produtiva, garantidora de um Estado forte, em todos os sentidos.

Estarei aqui; na ânsia de minimizar tanto o sofrimento dos incautos como também para lutar, com as armas que me estiverem disponíveis, pelo sucesso dos persistentes.

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